Fonte: Revista Consultor Jurídico · Autor: José Aloysio Cavalcante Campos
Em tempos de Reforma do Judiciário, onde os procuradores do estado buscam sua autonomia administrativa e financeira — que alguns erroneamente estão confundindo com independência funcional — e no momento em que a advocacia pública tem sido amplamente criticada como a grande vilã da morosidade da justiça, inclusive de forma veemente pela OAB, entendemos oportuno, sem nenhuma pretensão de referência para resolução dos problemas atuais do Judiciário, apresentar fatos que consideramos relevantes no contexto atual das discussões em torno do tema.
O estado do Pará está pagando desde março de 2004, em lotes mensais, os precatórios, deste exercício de 2004. Pelas projeções estaremos quitando todos os precatórios, tanto da administração direta quanto indireta (autarquias e fundações) até novembro de 2004 totalmente corrigidos. Até esta data não temos conhecimento de nenhum pedido de intervenção federal no Pará em tramitação no STF.
O pagamento tempestivo dos precatórios no âmbito da administração pública do estado do Pará (direta e indireta) tem sido prática ordinária desde 1999 a partir de decisão política do governo do estado em assumir o pagamento das dívidas após regular apreciação pela Procuradoria Geral do Estado.
Nesse sentido e com esta orientação a primeira e urgente tarefa, após assunção da Chefia da PGE em fevereiro de 1999, foi negociar o pagamento de dívidas de precatórios vencidos e impagos da Fundação Santa Casa de Misericórdia cujos recursos financeiros estavam, em março de 1999, sendo objeto de bloqueios judiciais.
Nesta tarefa, louve-se a excepcional disposição do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região, com sede em Belém-Pará, em agir no sentido de reunir credores e Procuradoria Geral do Estado buscando soluções que afinal contribuiram para a quitação de todo o passivo vencido, regularizando, até este exercício, o pagamento das demais requisições.
Esta situação foi essencial para determinar a designação de um grupo de procuradores e peritos em cálculos, apoiados por outros servidores, sob a chefia do Procurador do estado Dr. Pedro Miléo, hoje aposentado, com a finalidade específica de investigar ou verificar detidamente erros materiais ou outros vícios processuais em precatórios. A partir de agosto de 2002, com a última reforma legal da legislação complementar desta PGE, o setor foi institucionalizado como Procuradoria de Execuções.
Os resultados obtidos superaram as expectativas e os serviços foram estendidos a processos judiciais movidos contra as empresas da administração indireta em demandas com acentuado e significativo risco de passivo judicial.
A economia gerada para o erário público ultrapassou, no período de 1999 a 2004, a importância de R$ 150 milhões que se compõe, basicamente, de excessos gerados por erros de cálculos e outros vícios que inflaram os valores objeto de condenação.
Em suma, os valores acima estavam consolidados como coisa julgada e implicavam na obrigação de pagar pelo estado do Pará e por força da intervenção dos serviços de todos os integrantes da Procuradoria de Execuções, procuradores e servidores de apoio, foram quitados, em sua grande maioria através de acordos judiciais, com rigorosa observância da ordem de preferência estabelecida pelo Art. 100 da CF/88, em valores justos e reais, com acentuada redução dos saldos que compunham a condenação original.
Todas as negociações foram conduzidas de modo absolutamente transparente com a presença dos advogados dos credores de precatórios, muitas vezes acompanhados de seus clientes e de seus respectivos peritos contadores, com acesso ilimitado a memória de cálculos efetuada por aquele setor, podendo-se concluir que o índice de acordos para quitação das dívidas judiciais sempre foi próximo de cem por cento.
E na hipótese de não realização de acordo, o valor objeto da discussão é depositado integralmente, de modo a permitir a continuidade da quitação dos demais precatórios, em tudo observada a ordem de preferência constitucional.
A idéia da revisão da coisa julgada, de início considerada absurda, foi ganhando corpo na proporção em que as medidas judiciais e administrativas impetradas por esta Procuradoria, no âmbito das Presidências do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará e do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região, foram precedidas do depósito integral dos valores discutidos, com pedido expresso de liberação da quantia incontroversa, permitindo ao autor usufruir, após longa espera, de parte de seu crédito enquanto a quantia controversa servia de garantia para instrução do denominado Pedido de Ordem Processual que objetivava a revisão dos erros materiais. Com esta postura procura-se evitar as alegações de graciosidade e litigância de má-fé nas medidas que visam questionar a coisa julgada, não distanciando esta prática do princípio da segurança jurídica, igualmente importante na formação da ordem social mais justa.
Estes registros são importantes em razão da magnitude do impacto financeiro que poderia ser oposto ao estado de forma indevida e pelo inusitado das medidas judiciais, além do resultado final obtido envolvendo o respeito às ordens judiciais com o devido cumprimento do mandamento constitucional insculpido no art.100 da Constituição Federal.
A atuação preventiva da PGE no âmbito de toda a administração pública tem se constituído como modo de ação institucional destinada a prevenir ou impedir a repetição de situações que além de fragilizar a prestação dos serviços públicos contribuem para a geração de passivos judiciais ou extrajudiciais que oneram a administração pública.
Neste sentido a Procuradoria Geral do Estado, a partir de 1999, atuou, basicamente, de duas formas. Inicialmente foram identificadas as causas e ocorrências de demandas judiciais mais comuns em cada secretaria de estado a partir de processos judiciais sob controle da PGE.
Com estes elementos foram realizadas reuniões com todos os órgãos da administração direta ocasião em que as áreas de consultoria jurídica, licitação, recursos humanos, administração e chefia de gabinete eram convocadas a apresentar suas dificuldades e dúvidas mais frequentes e que contribuíam para a surgimento das demandas judiciais.
Ao fim, com a presença do secretário de estado e procurador geral, foram extraídas soluções, algumas manualizadas, para evitar a repetição de situações ensejadoras de litígios contra o Estado. Estas reuniões têm ocorrido com a frequência exigida para cada órgão público.
Ainda com o objetivo de reduzir as demandas ou extinguir outras e visando, igualmente, evitar alegações de litigância de má-fé na atuação judicial da PGE, foram editadas normas internas recomendando a não interposição de recursos ou rescisórias em situações reconhecidamente pacificadas nos tribunais originadas por equivocadas interpretações dos diversos órgãos da administração pública.
Na administração indireta, cuja advocacia é conduzida internamente por advogados empregados ou terceirizados, foram solicitados relatórios de todos os processos judiciais bem como informações sobre a estrutura e funcionamento dos setores jurídicos, com sugestões desta Procuradoria, em alguns casos, de alteração na rotina daqueles serviços jurídicos, tendo, inclusive, a PGE/Pará incentivado a realização de concursos públicos para contratação de advogados para aquelas entidades.
Em seguida, foram identificados processos judiciais com riscos de geração de passivos judiciais considerados significativos e que mereceram a intervenção desta PGE suscitando a legitimidade do estado em razão do impacto no erário público ou a partir da condição de acionista majoritário de algumas estatais.
Como essa, outras inúmeras atuações desta PGE redundaram na diminuição de passivos judiciais consolidados como coisa julgada ou prestes a tal com efetiva contribuição na mitigação das dificuldades e falhas, ainda existentes, enfrentadas nas rotinas dos milhares de processos submetidos aos procuradores, estes os grandes responsáveis pelos resultados descritos, que na realidade, limitam-se a observar os princípios constitucionais reguladores da administração pública.
No que toca a atividade fim da Procuradoria Geral do estado do Pará e das demais Procuradorias Gerais dos estados e Distrito Federal, onde não faltam outros exemplos de resultados positivos na medida dos limites de cada orçamento, a preocupação é garantir o exercício da representação judicial do estado de forma amplamente profissional, possibilidade que poderá ser ampliada com a inclusão na Reforma do Judiciário da autonomia das procuradorias, proporcionando aos procuradores do estado, condições materiais para o melhor desenvolvimento de suas atividades quer no âmbito judicial quer no administrativo, apresentando-se em juízo ou fora dele, no mínimo, em condições iguais aos grandes conglomerados de advogados privados, primando por sua atuação preventiva junto aos órgãos da administração direta e indireta.
Evolução da Quantidade de Precatórios Cíveis e Trabalhistas e dos Valores Requisitados a partir de 2002 (administração direta)
2002 – 302 requisições — R$ 13.262.282,08
2003 – 163 requisições — R$ 24.015.298,02
2004 – 102 requisições — R$ 19.198.565,06
2005 – 49 requisições — R$ 8.774.330,32
Parte de medidas adotadas em nossa rotina
– investimento em cursos de especialização e treinamentos específicos tanto para procuradores quanto para os servidores de apoio;
– livre diálogo e respeito nas relações com as associações de Procuradores e Servidores;
– garantias técnicas e materiais de pleno exercícios das funções ao procurador (biblioteca, apoio administrativo, computadores, ambiente propício e outros meios (internet, estagiários, etc);
– busca constante de adaptar a estrutura às novas demandas da legislação (por exemplo suporte para obediência ao art. 604 do CPC – cálculos da execução) e da sociedade (consumidor, meio ambiente etc);
– entrosamento e articulação com as demais instituições essenciais à justiça, em especial o Poder Judiciário e o Ministério Público;
– atuação nos tribunais com memoriais, sustentação oral, visitas a juízes e acompanhamento permanente na tramitação de processos relevantes;
– atuação preventiva e entrosamento com as direção das entidades da administração direta e indireta;
– ações para uniformização da consultoria na administração pública;
– antecipação de providências quando cabíveis (quer diante das ações instauradas no judiciário quer internamente no âmbito da administração);
– investir no relacionamento entre colegas e servidores;
– nas demandas judiciais: evitar a litigância de má-fé e ações procastinatórias;
– celeridade na tomada de decisões e nas conclusões de pareceres;
– inclusão na Lei de Diretrizes Orçamentárias da obrigação da PGE verificar previamente todos os precatórios da administração indireta;
– articulação com as áreas de planejamento (discutindo tempo e modo de pagamento) e fazenda (liberação dos recursos financeiros);
– realização de conferências com o objetivo de consolidar o entendimento da revisão da coisa julgada.