A unidade da advocacia é um dos princípios valorizados pela OAB. Comum a rotulagem de advogados de reclamantes e de reclamados, de empresários e de consumidores, de cíveis e de criminais, de públicos e de privados, de residentes na capital e no interior. As distinções atendem mais as necessidades de compreensão, de especialização e aos critérios funcionais do que a substância da atuação de cada colega. Todos, porém, exercem papéis essenciais na representação e defesa dos seus clientes.
Narrativas que extrapolam a boa finalidade de conceituação podem levar à polarização e servir à divisão da classe, ignorando a lei, camuflando a realidade, ofuscando o mérito e fragilizando a advocacia. Afinal, o sentimento divisionista segrega e dificulta a construção de soluções coletivas e inclusivas e por vezes só serve para atender visões próprias e fins egoísticos.
A verdadeira força de uma instituição como a OAB sempre estará na sua capacidade de se unir em prol de objetivos comuns, respeitando as divergências e buscando sempre o bem-estar coletivo. Quando se foca nas diferenças, no lugar os pontos sinérgicos, comprometemos o potencial de evolução e deixamos de lado a oportunidade de aprender com perspectivas variadas.
Nesse espectro, a Procuradoria-Geral do Estado do Espírito Santo (PGE-ES) também é um dos grandes escritórios de advocacia do estado, com os seus 120 advogados (procuradores), que atuam em todas as instâncias da justiça comum, trabalhista e federal, de norte a sul do estado, de Vitória até Brasília, bem como em todas as 27 unidades federadas do Brasil. Essa ideia de identidade e atuação competente resulta em feitos recentes e de grande impacto, como o sucesso das medidas de reparo dos efeitos da tragédia de Mariana, que levaram ao maior acordo ambiental da história, 170 bilhões de reais; a pactuação de royalties em processo do Estado contra a União, com o ingresso de 1 bilhão de reais nos cofres do Estado; a retomada da obra do Cais das Artes; a mediação na tragédia das escolas de Aracruz; a transação tributária e as milhares de ações na justiça sobre saúde, execuções fiscais, servidores, terceirizados que exemplificam a atividade e a qualidade do advogado capixaba, na defesa do nosso Estado e da nossa sociedade.
Nesse propósito comum, a advocacia é plena e apenas uma, sempre exercendo seu papel relevante na OAB, independente da natureza do seu cliente. Prova disso está nas raízes, na história e na tradição da OAB. Em meio à Revolução de 1930, por exemplo, Levi Carneiro, então Consultor-Geral da República, teve participação decisiva na criação da entidade.
Ao longo de mais de nove décadas, procuradores de Estado tiveram participação emblemática na OAB nacional e importância destacada na luta democrática, defendendo não apenas a ética e a legalidade, mas também os direitos e liberdades dos cidadãos. Assim como o criminalista Sobral Pinto, Raymundo Faoro e Eduardo Seabra Fagundes, também procuradores do Estado, são símbolos de resistência e de integridade, especialmente em momentos críticos da história brasileira.
Durante a elaboração da Constituição de 1988, a advocacia pública teve uma participação expressiva e essencial. Procuradores como Ulisses Guimarães, Presidente da Constituinte, e Bernardo Cabral, o seu Relator, participaram ativamente do processo de fundação da ordem cidadã até hoje vigente e foram responsáveis por incluir e defender dispositivos fundamentais à preservação dos direitos individuais e ao fortalecimento do Estado Democrático de Direito. Suas atuações, enquanto advogados plenos, garantiram que a nova Carta refletisse os anseios pelos direitos fundamentais, justiça social e mais e mais democracia.
Aqui no Espírito Santo não foi diferente, pois marcou a nossa história o ex-presidente da OAB-ES e também Procurador do Estado Agesandro da Costa Pereira, que deixou um legado de dedicação e de compromisso com a defesa dos princípios éticos e democráticos.
Num momento paradoxal da nossa história, de tantos avanços tecnológicos e de tantas oportunidades, ao mesmo tempo de tanta polarização e aumento de desigualdades, não podemos aceitar visões egoísticas que se fortalecem pelo mantra da divisão de uma classe tão importante para os valores fundamentais de uma sociedade civilizada, nos tornando míopes diante de tantas injustiças.
A unidade da advocacia e a compreensão da sua história são vitais para entender o DNA da OAB e fortalecer a sua legitimidade perante a sociedade e as suas instituições. Somos todos pela defesa da advocacia, do interesse público e da justiça mais acessível e efetiva. Que o bem comum e o justo sempre prevaleçam em nossas escolhas, sem preconceitos ou segregação de classe.
Marcello Terto e Silva é procurador do Estado de Goiás, conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ouvidor nacional de Justiça
Gustavo Sipolatti é procurador do Estado do Espírito Santo e presidente da Associação dos Procuradores do Estado do Espírito Santo (APES)